sexta-feira, outubro 05, 2007

Gemido


Perdia a conta aos gemidos que não conseguia evitar. O último, já fraco e cansado, adormecia na almofada suada. Era o corpo fatigado que se entregava ao descanso, era a cabeça que repousava porque já não se aguentava erguida, era o olhar turvo que se fechava. Depois do terceiro suspiro, escorria uma lágrima pelo canto do olho esquerdo que se deixa morrer absorvida pelos lençóis amarrotados. Uma cama desfeita, com um aspecto desleixado, de quem se tinha descuidado dela ou apenas de quem a explorou de fio a pavio, sem olhar a quê, nem a quem. As pálpebras coladas não queriam acordar à noite fria que se tinha posto. Cada membro aconchegava-se ainda à intensidade do momento que se tinha proporcionado e que tinha culminado no que de melhor ela podia fazer: amor. Não temia assumir a sua opção, não receava os olhares alheios ou mais conservadores. Fazia-o e todos sabiam porque gemia e em cada grito que soltava, sentia o alívio da sua alma. Ignorava os murros na parede, as reclamações da vizinhança. Uma vez envolta na ofegante paixão carnal: cegava e ensurdecia. Só conseguia voltar a si calmamente, entregue à sua almofada, que acabava de beber a última gota da alegria e acolhia esta muher no sono profundo dos amantes.

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