quarta-feira, agosto 01, 2007

Queres que defina saudade?


- Saudade? O que é a saudade? Todos os portugueses falam-me dela, mas não a compreendo.
- Boa pergunta. Acho que é das palavras de que mais nos orgulhamos de ter, como portugueses. Cada vez que nos falam dela os nossos olhos brilham e rapidamente saimos em defesa dizendo que não há palavras que a definam, é uma coisa que se sente, é indescritível. Por um lado continuamos no nosso saudosismo, por outro assemelhamo-nos a crianças que guardam um brinquedo precioso e raro, contentes porque até podemos não ter mais nada que realmente valha a pena, mas a saudade... Essa ninguém nos tira. Essa acompanha-nos em cada momento, no fado da vida. Mas este não se canta, vive no coração dos sonhadores, que olham o passado e o desejam como a mais nada, uma vez que o futuro não aparenta reservar nada que nos marque. Por isso perante o vazio do nada, temos o tudo que um dia já foi nosso, que nos marcou e nos alimenta. A saudade é o sabor insípido e desconsolado de quem sozinho não sabe para onde se virar, uma revolução estrangeira incapaz de se reconhecer na situação actual em que se encontra e vivendo a dicotomia entre a vontade desejada e o possível que é claramente insuficiente e mediocre. Saudade é a vivência de uma revolta interior porque não se compreende como é que o corpo não acompanha o ciclo natural das coisas e a mente teima em trazer de volta a terna lembrança daquela coisa boa, que hoje deveria ser uma mera recordação encurralada num baú decorado a pó e teias de aranha, com cheiro a mofo e que dá medo só de pensar na aventura de o abrir porque não sabemos o que nos reserva. Saudade é o suspiro que nos preenche os pulmões num silencioso desabafo de desespero, num grito que queríamos que nos aliviasse a alma, mas que é inútil. Enchemos os pulmões até mais não, até que nos doam, até que nos falte o ar, na esperança de que assim nos sintamos mais completos porque tudo em nós é a preto e branco, num morno assustador que ou nos dá para não reagirmos ou nos engrena num beco sem saída de aflição e tristeza. É a lágrima que se chora porque não se controla ou aquela que não é derramada, mas que o coração absorveu, numa impressionante tentativa de consumir o que perdeu. Saudade é um oh tempo volta para trás porque se calhar não demos o devido valor ao que tivemos, não demos o que podíamos dar, não dissemos o que podíamos dizer e hoje arrependemo-nos e custa-nos viver com isso, com essa triste realidade e incapazes de cortar esse cordão umbilical. Saudade é abraçarmos aquilo que perdemos com toda a verdade e o vigor do nosso coração, sem medo de deixarmos transparecer o que sentimos porque a sua ausência foi insuportável e o nosso orgulho vale nada. Só sente saudade quem ama, mas ama a sério porque se amou permitiu que aquilo fizesse parte do seu universo e, uma vez desaparecido, a dor daquela perda, daquela falha é incrivelmente dolorosa e dificílima de preencher. Isto é a saudade.
- Obrigada pelo sinónimo que me dás. Sim, sei o que ela é, já a compreendo. Ela também vive dentro de mim.

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