segunda-feira, agosto 06, 2007

Quem as não tem


Cartas de amor: pedaços de papel colorido, decorados com pensamentos e desabafos adolescentes, tenras esperanças e cegas confianças, certezas absolutas e verdades inquestionáveis, vãs expectativas e puras ironias, suspiros sinceros e vagos, tudo baseado, sedeado na maior das fragilidades humanas - o sentimento. A vulneralidade das emoções, a ridicularidade das posições, a assustadora facilidade com que nos entregamos a tudo o que se apresenta mais visível e momentaneamente satisfatório. Correm rios de tinta que procuram exprimir o que o coração sente quando apenas deseja ser possuído por outra pessoa que escolheu para partilhar a vida. Porque as palavras são todas inúteis perante tanto sentimento e todas as declarações parecem insuficientes, são páginas que se querem da vida de onde brotam bonitas palavras de amor, umas mais caras que outras, mas nada disso importa na hora H de provar ao mundo e à sua cara metade que tudo o que sente é real e que nada tem valor sem o tu.

Infelizmente para a maioria tudo tem um fim e nesse dia as gavetas repletas de certezas, esvaziam-se num ápice. Não que os papéis sejam instantaneamente roídos por bichos comilões de papel ou que por artes mágicas tudo desapareça, mas o tudo que lá estava perdeu todo o sentido, deixou de ter uma razão para existir. As cartas perfumadas, algumas esborratadas pelas lágrimas de felicidade e realização derramadas na altura em que foram lidas, cartas bonitas com mensagens codificadas que apenas para aquelas duas pessoas faziam sentido. Partilhavam um código que haviam criado e em segredo, por meias palavras, diziam aquilo que a mais ninguém dizia respeito senão a ambos. Elas tinham uma história, relatavam um momento, um episódio, uma alegria, uma prespectiva de futuro que, ao que parece, deixou de se concretizar. De uma boa lembrança passam a um fardo difícil de suportar, carregam as noites mal dormidas porque se faziam planos e se construíam castelos sobre nuvens de algodão doce. Hoje tudo é amargo e cinzento, ficou um travo de estranheza, uma dor no peito, um nó na garganta, uma tristeza de morte. Tudo desmoronou menos elas. As palavras escritas duram para sempre, para a eternidade, já as ditas, essas voam com o vento e deixam apenas o vago da memória. Os sentimentos, esses andam ao sabor da maré, conforme se proporcionam momentos mais ou menos intensos, sempre em busca do prazer e da intensidade. Poucos são os que não se assustam com a radicalidade que o verdadeiro amor exige, poucos resistem, poucos sobrevivem.

O que lhes fazer na hora do aperto? Não sei... Compete a cada um encontrar o final que o fizer mais feliz, aquele que não lhe traga o remorso segundos, minutos, horas, dias, semanas, meses, anos, décadas mais tarde.

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